Pode despejar inquilino por falta de garantia?

É incabível o deferimento de liminar de despejo quanto não há comprovação de que o locatário foi efetivamente notificado pela locadora da ausência de garantia contratual.

Processo: 5031081-33.2023.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Marcos Fey Probst
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Sexta Câmara de Direito Civil
Julgado em: 29/08/2023
Classe: Agravo de Instrumento

Agravo de Instrumento Nº 5031081-33.2023.8.24.0000/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001136-05.2023.8.24.0031/SC

RELATOR: Desembargador MARCOS FEY PROBST

AGRAVANTE: IEDA DIRLEI SEVEGNANI ADVOGADO(A): THIAGO MAHFUZ VEZZI (OAB SC040415A) AGRAVADO: ALINE DUARTE KRAFCHINSKI DA SILVA AGRAVADO: EDUARDO DA SILVA

RELATÓRIO

1. Ieda Dirlei Sevegnani interpôs agravo de instrumento em face da decisão que, na Ação de Despejo nº 5001136-05.2023.8.24.0031, ajuizada em desfavor de Aline Duarte Krafchinski da Silva e Eduardo da Silva, indeferiu o pedido de despejo em sede liminar nos seguintes termos (evento 12, DESPADEC1, origem):
(…) Contudo, os documentos apresentados não se mostram aptos a demonstrar que o locador notificou o locatário e decorreu o prazo de 30 dias para apresentar nova garantia locatícia.
Para ser válida a notificação premonitória de exoneração de fiança para que o locatário apresente nova garantia no prazo de 30 dias, deve haver a entrega direta e pessoal ao locatário, uma vez que a sanção é a medida extrema de despejo liminar.
Nesse sentido, extraio:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE NOVA GARANTIA. DECISÃO QUE NEGOU O PEDIDO LIMINAR DE DESPEJO. RECURSO DA AUTORA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO DO LOCATÁRIO A RESPEITO DA EXONERAÇÃO DO FIADOR. ÚNICA GARANTIA PRESTADA NO ÂMBITO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO RESIDENCIAL ENTABULADO. MENSAGEM DE WHATSAPP E E-MAIL SEM A MÍNIMA COMPROVAÇÃO DA AUTENTICIDADE DO DESTINATÁRIO. CARTA COM AVISO DE RECEBIMENTO QUE FOI DEVOLVIDA. DESATENDIMENTO DO REQUISITO DISPOSTO NO INCISO VII, ART. 59 DA LEI 8.245/1991. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, TJ-SC – AI: 50064225720238240000, Relator: Marcos Fey Probst, Data de Julgamento: 07/03/2023, Sexta Câmara de Direito Civil) (grifei)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE DESPEJO – EXONERAÇÃO DA FIANÇA – NOVA GARANTIA – NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO LOCATÁRIO – NECESSIDADE – CITAÇÃO – INÉRCIA DA LOCATÁRIA EM APRESENTAR NOVA GARANTIA – PEDIDO PROCEDENTE. – A notificação premonitória prevista pelo art. 40, parágrafo único da Lei 8.245/91, deve ser entregue pessoalmente ao locatário para ser considerada válida – Mesmo sendo a notificação extrajudicial  inválida, vez que não entregue pessoalmente, uma vez citado o locatário para a pretensão do locador de renovação da garantia, e, tendo ele se quedado inerte durante todo o feito, deixando de indicar novos fiadores, a hipótese é de procedência do pedido inicial. (TJMG, AC 0633578-47.2010.8.13.0702, Rel. Des. FRANCISCO BATISTA DE ABREU, j. 20/11/2014) (grifei)
No caso concreto, torno a dizer, não há provas da notificação extrajudicial encaminhada à requerida, não se prestando, por certo, o print da tela de celular para tal desiderato. Importa asseverar, ainda, ser o locador quem deve notificar – e não o fiador – como requisito para o despejo liminar, haja vista trata-se de contrato entre locador e locatório. 
Diante do exposto, ausentes os requisitos legais ao deferimento do pleito, indefiro a liminar.
Em suas razões (evento 1, INIC1), a agravante sustenta que: (i) a parte recorrida está inadimplente com o contrato de locação, que não possui nenhuma garantia; (ii) em decorrência da falta de pagamentos dos agravados, o fiador procedeu à rescisão do contrato de fiança; (iii) as comunicações à imobiliária e aos inquilinos se operaram por meio digital, conforme provado na exordial; (iv) o contrato de fiança deve ser interpretado de forma restritiva; e (v) houve o envio mediante aplicativo de mensagem contendo a notificação, que foi lida e respondida pela ré.
Postulou a concessão da tutela de urgência recursal, o que foi indeferido (evento 7, DESPADEC1), e, no mérito, o provimento da espécie.
É o relatório.
Embora intimada, a parte recorrida deixou de apresentar contrarrazões.
Desnecessário o envio à Procuradoria-Geral de Justiça.
É o relatório.

VOTO

1. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
2. No mérito, o agravo de instrumento deve ser desprovido.
Por ocasião da análise da liminar (evento 7, DESPADEC1), assim me manifestei:
A Lei nº 8.245/1991 possibilita a concessão liminar de desocupação no caso do término do prazo notificatório previsto no parágrafo único do art. 40 sem a apresentação de nova garantia. In verbis: 
Art. 59. Com as modificações constantes deste capítulo, as ações de despejo terão o rito ordinário.§ 1º Conceder-se-á liminar para desocupação em quinze dias, independentemente da audiência da parte contrária e desde que prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, nas ações que tiverem por fundamento exclusivo:(…)VII – o término do prazo notificatório previsto no parágrafo único do art. 40, sem apresentação de nova garantia apta a manter a segurança inaugural do contrato
Art. 40. O locador poderá exigir novo fiador ou a substituição da modalidade de garantia, nos seguintes casos:(…)IV – exoneração do fiador;(…)Parágrafo único. O locador poderá notificar o locatário para apresentar nova garantia locatícia no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de desfazimento da locação.
Ou seja, para ser deferido o pedido liminar de despejo em razão da ausência de nova garantia no contrato de locação, primeiramente é necessário que o locatário seja devidamente notificado, a fim de que possa apresentar novo fiador ou substituir a modalidade de garantia
Compulsando os autos, observo que as partes firmaram o Contrato Particular de Locação Residencial nº 125 e, conforme a cláusula 10ª, “o Inquilino contratou a VELO COBRANÇA LTDA., quem cobrirá, em caso de inadimplência daquele primeiro, até 12 (doze) meses o valor do pacote de locação informado quando da contratação” (evento 1, ANEXO4, p. 4, origem).
Alega a autora na inicial que houve a exoneração da empresa garantidora (Velo Cobrança Ltda.), acarretando a perda da garantia do contrato de locação, situação que baliza o pedido de despejo em sede liminar, na visão da agravante.
Porém, ao menos em sede de cognição sumária, observo que não há comprovação de que os locatários tenham sido realmente notificados nos termos do que consta do parágrafo único do art. 40 da Lei n. 8.245/1991 (“O locador poderá notificar o locatário para apresentar nova garantia locatícia no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de desfazimento da locação.”)
.
Em verdade, conquanto a agravante tenha trazido aos autos capturas de tela de conversa de “Whatsapp” (evento 1, ANEXO10, origem), não há garantia de que o número de celular realmente pertença à locatária. Isto é, não há dados mínimos que permitam comprovar a autenticidade do receptor das correspondências eletrônicas, muito menos que seu conteúdo preencha os requisitos previstos no parágrafo único do art. 40 da Lei de Locações (mérito da própria notificação).
Portanto, diante da ausência de comprovação de que os locatários foram efetivamente notificados pela locadora quanto à ausência de garantia contratual, nos moldes do parágrafo único do art. 40 da Lei n. 8.245/1991, incabível o deferimento do pretendido despejo liminar. 
Em situação semelhante, aliás, de minha lavra:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE NOVA GARANTIA. DECISÃO QUE NEGOU O PEDIDO LIMINAR DE DESPEJO. RECURSO DA AUTORA.AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO DO LOCATÁRIO A RESPEITO DA EXONERAÇÃO DO FIADOR. ÚNICA GARANTIA PRESTADA NO ÂMBITO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO RESIDENCIAL ENTABULADO. MENSAGEM DE WHATSAPP E E-MAIL SEM A MÍNIMA COMPROVAÇÃO DA AUTENTICIDADE DO DESTINATÁRIO. CARTA COM AVISO DE RECEBIMENTO QUE FOI DEVOLVIDA. DESATENDIMENTO DO REQUISITO DISPOSTO NO INCISO VII, ART. 59 DA LEI 8.245/1991. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5006422-57.2023.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Marcos Fey Probst, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 07-03-2023).
Em julgamento definitivo, o entendimento permanece idêntico.
Afinal, em atenção ao que disciplina a Lei nº 8.245/1991, observo que a parte agravante não demonstrou que houve a devida notificação do locador para apresentação de nova garantia locatícia, situação que autorizaria, após o prazo de trinta dias (Lei nº 8.245/1991, art. 40, inc. IV, parágrafo único), a concessão do despejo em sede liminar no caso de não apresentação de nova garantia apta a manter a segurança contratual (Lei nº 8.245/1991, art. 59, § 1º, inc. VII).
Aliás, deste Órgão Fracionário:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO COM PEDIDO DE LIMINAR DE DESOCUPAÇÃO ANTE A EXONERAÇÃO DA FIANÇA E NÃO APRESENTAÇÃO DE NOVA GARANTIA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERIU A TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. SEGURO GARANTIA QUE FINDOU E NÃO FOI RENOVADO. NOTIFICAÇÃO VIA E-MAIL E CARTA COM AVISO DE RECEBIMENTO PELA EMPRESA SEGURADORA. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. IMPOSSIBILIDADE. ENDEREÇO RESIDENCIAL E ELETRÔNICO QUE CONSTAM NOS CONTRATOS, PORÉM NÃO HÁ COMPROVAÇÃO DE CIÊNCIA INEQUÍVOCA. VÍCIOS LEGAIS. REMETENTE QUE INFORMOU O CESSAR DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE SEGURO, CONCEDENDO PRAZO PARA A SUA SUBSTITUIÇÃO. PROPRIETÁRIA E REPRESENTANTE QUE INTERMEDIOU A LOCAÇÃO NÃO PROCEDERAM COM A NOTIFICAÇÃO PARA A REGULARIZAÇÃO DA GARANTIA. EXEGESE DOS ARTS. 40 E 59, § 1º, INC. VII DA LEI 8.245/91. AUSENTES OS PRESSUPOSTOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5021469-71.2023.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Joao de Nadal, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 01-08-2023).
3. Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo de instrumento.

Documento eletrônico assinado por MARCOS FEY PROBST, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3841377v9 e do código CRC 3af87163.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MARCOS FEY PROBSTData e Hora: 29/8/2023, às 21:14:27

Agravo de Instrumento Nº 5031081-33.2023.8.24.0000/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001136-05.2023.8.24.0031/SC

RELATOR: Desembargador MARCOS FEY PROBST

AGRAVANTE: IEDA DIRLEI SEVEGNANI ADVOGADO(A): THIAGO MAHFUZ VEZZI (OAB SC040415A) AGRAVADO: ALINE DUARTE KRAFCHINSKI DA SILVA AGRAVADO: EDUARDO DA SILVA

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE NOVA GARANTIA. DECISÃO QUE NEGOU O PEDIDO LIMINAR DA MEDIDA DESALIJATÓRIA. RECURSO DA AUTORA.
ALEGADO DESACERTO DO DECISUM. SEM RAZÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO DOS LOCATÁRIOS A RESPEITO DA ALEGADA EXONERAÇÃO DO FIADOR. ÚNICA GARANTIA PRESTADA NO ÂMBITO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO RESIDENCIAL ENTABULADO. MENSAGEM DE WHATSAPP SEM A MÍNIMA COMPROVAÇÃO DA AUTENTICIDADE DO DESTINATÁRIO. DESATENDIMENTO DOS ARTS. 40 E 59, § 1º, INC. VII DA LEI 8.245/91. DECISÃO MANTIDA. 
RECURSO DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 29 de agosto de 2023.

Documento eletrônico assinado por MARCOS FEY PROBST, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3841378v5 e do código CRC 87af3966.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MARCOS FEY PROBSTData e Hora: 29/8/2023, às 21:14:27

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 29/08/2023

Agravo de Instrumento Nº 5031081-33.2023.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador MARCOS FEY PROBST

PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR.

PROCURADOR(A): THAIS CRISTINA SCHEFFER
AGRAVANTE: IEDA DIRLEI SEVEGNANI ADVOGADO(A): THIAGO MAHFUZ VEZZI (OAB SC040415A) AGRAVADO: ALINE DUARTE KRAFCHINSKI DA SILVA AGRAVADO: EDUARDO DA SILVA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual do dia 29/08/2023, na sequência 47, disponibilizada no DJe de 14/08/2023.
Certifico que a 6ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 6ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBSTVotante: Desembargador JOAO DE NADALVotante: Juiz RENATO LUIZ CARVALHO ROBERGE
JONAS PAUL WOYAKEWICZSecretário

Fonte: TJSC

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