Consumidor por equiparação e instituição financeira

Consumidor por equiparação e instituição financeira

VULNERABILIDADE FRENTE À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA. POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ONUS PROBANDI NO CASO. TESE DE MÉRITO JÁ APRECIADA NA DECISÃO

Processo: 5041557-67.2022.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Carlos Roberto da Silva
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Sétima Câmara de Direito Civil
Julgado em: 30/03/2023
Classe: Agravo de Instrumento

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Agravo de Instrumento Nº 5041557-67.2022.8.24.0000/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5017170-45.2020.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

EMBARGANTE: BANCO RODOBENS S.A.

RELATÓRIO

Banco Rodobens S.A. opôs embargos de declaração contra a decisão colegiada (evento 24, ACOR1-RELVOTO2) que conheceu do recurso interposto pela parte embargante e negou-lhe provimento, a fim de confirmar a decisão interlocutória que deferiu o pedido de inversão do ônus probatório em favor da parte autora Rudney Guarnieri Marcondes.
Em seus argumentos (evento 32), a parte ré sustentou que houve omissão/contradição deste Órgão Julgador no tocante à caracterização de relação consumerista entre as partes.
Requereu, assim, o acolhimento dos aclaratórios para que haja manifestação sobre os pontos suscitados, inclusive para fins de prequestionamento.
Intimada a parte embargada nos moldes do art. 1.023, § 2º, do Código de Processo Civil, aportaram as contrarrazões (evento 38) e vieram os autos conclusos.
Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de embargos de declaração opostos contra acórdão deste Órgão Fracionário que conheceu do recurso interposto pela parte embargante e negou-lhe provimento.
Porque presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.
É sabido que os embargos de declaração são adequados para sanar omissão, obscuridade, contradição ou erro material constante no pronunciamento questionado, na forma do art. 1.022 do Código de Processo Civil.
Acerca do referido dispositivo legal, extrai-se da doutrina especializada a seguinte compreensão:
O CPC de 2015 acrescentou uma outra hipótese ao rol de cabimentos dos embargos, estabelecendo, expressamente, serem admissíveis para corrigir erro material, ou seja, aquele manifesto, visível, facilmente verificável (CPC/2015, art. 1.022, III). […]. Trata-se de recurso com fundamentação vinculada, vale dizer, somente pode ser oposto nas hipóteses restritas previstas em lei. Com relação à omissão, o parágrafo único explicitou o que deve ser considerado como decisão omissa, demonstrando a severa e minuciosa repulsa da legislação atual à tolerância com que os tribunais vinham compactuando com verdadeiros simulacros de fundamentação. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de Processo Civil anotado. – 25. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2022. p. 1.262).
Feito o introito, passa-se à análise da presença, no acórdão embargado, de algum dos vícios apontados no presente recurso.
I – Da alegada omissão/contradição:
A parte ré sustenta que houve omissão/contradição deste Órgão Julgador no tocante à caracterização de relação consumerista entre as partes.
No caso em tela, contudo, não se vislumbra nenhuma das hipóteses acima arroladas, em especial a aludida omissão/contradição na decisão objurgada.
Isso porque o acórdão atacado foi claro ao explicitar os fundamentos que levaram ao conhecimento e ao desprovimento do recurso interposto pela parte embargante, manifestando-se, inclusive, em relação à questão dita omissa/contraditória.
Do corpo do voto extrai-se o excerto (evento 24):
Porque atuais e pertinentes os argumentos já lançados na decisão monocrática proferida nestes autos (evento 6), a fim de se evitar tautologia, transcreve-se parte dessa fundamentação para subsidiar o desprovimento, no mérito, do presente reclamo:
Volvendo ao caso concreto, adianta-se que não se evidencia em relação ao pedido de efeito suspensivo formulado a probabilidade do direito.
Explica-se.
No caso dos autos, ainda que não se vislumbre relação negocial direta entre agravante e parte autora, verifica-se a provável existência de cadeia de fornecimento entre o polo passivo da presente demanda, já que o recorrente, na condição de instituição bancária, supostamente teria realizado empréstimo de valores para a construtora corré (no intuito de edificar o empreendimento em questão), de modo que esta, posteriormente, alienou as correspondentes unidades autônomas aos consumidores (onde o demandante se enquadra).
Em face do acima descrito, verifica-se, ainda que em sede de cognição sumária, que parece existir relação de consumo entre as partes, uma vez que o banco recorrente se enquadra na figura de fornecedor e, igualmente, a parte autora é nítida consumidora.
Pontua-se que este Tribunal já entendeu em tal sentido quando analisou caso semelhante envolvendo a mesma situação e parte recorrente:
PROCESSUAL CIVIL – TUTELA DE URGÊNCIA – IMÓVEL – AVERBAÇÃO À MARGEM DA MATRÍCULA – REQUISITOS AUTORIZADORES (CPC, ART. 300) – PRESENÇA – MANUTENÇÃO DO DECISUM – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – CDC – CONSUMIDOR EQUIPARADO – POSSIBILIDADE1 Presentes a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, deve ser mantida a tutela de urgência para determinar a averbação da existência da demanda junto à matrícula do imóvel objeto da lide.2 Não há falar em descabimento da inversão do ônus probatório com base na legislação de consumo quando se está diante da figura do consumidor por equiparação. Mormente quando isso resulta apenas na obrigação de apresentar documentos e provas que estejam em poder do fornecedor. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5022476-69.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 06-07-2021).
Ademais, observa-se que o recorrido expressamente requereu a inversão do ônus probatório em sua petição inicial (Evento 1, INIC1, p. 16 dos autos de origem), fato que diferencia os presentes autos da situação existente em precedente judicial trazido pelo recorrente (Agravo de Instrumento n. 5061488-90.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rosane Portella Wolff, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 10-03-2022).
Em conclusão, tem-se que o autor se apresenta como consumidor por equiparação e possui aparente vulnerabilidade jurídica, técnica e econômica perante a instituição financeira agravante, o que é suficiente para que seja mantida incólume a decisão que deferiu a inversão do ônus da prova em favor da parte autora.
Nesse contexto, tendo como base a fundamentação acima, observa-se que a parte insurgente não logrou êxito em demonstrar o alegado desacerto da decisão recorrida, porquanto ausente a verossimilhança de suas alegações.
Nesse cenário, o que se concluiu é que, ao contrário do sustentado pela parte demandada em seus aclaratórios, da leitura do aresto é possível averiguar que houve a devida explicação dos motivos pelos quais foi mantida a inversão do ônus da prova com base na Legislação Consumerista.
De fato, ainda que ausente relação negocial direta entre as partes, foi possível constatar a provável existência de cadeia de fornecimento entre o polo passivo da presente demanda, já que o recorrente, na condição de instituição bancária, supostamente teria realizado empréstimo de valores para a construtora corré (no intuito de edificar o empreendimento em questão), de modo que esta, posteriormente, alienou as correspondentes unidades autônomas aos consumidores (onde o demandante se enquadra). 
Nesse cenário, o autor se apresenta como consumidor por equiparação e possui aparente vulnerabilidade jurídica, técnica e econômica perante a instituição financeira agravante, o que é suficiente para que seja mantida incólume a decisão que deferiu a inversão do ônus da prova em favor da parte demandante.
Com efeito, a insurgência manifestada pela parte embargante revela, em última análise, o seu inconformismo com o teor da decisão atacada, circunstância que desafia recurso próprio.
Ademais, é pacífico que os aclaratórios não se prestam à reanálise de matéria já examinada, ainda que sob o argumento de deficiente apreciação dos fatos e dos elementos probantes.
A propósito:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGADA OMISSÃO NO ACÓRDÃO. INOCORRÊNCIA. RESSUSCITAÇÃO DE ARGUMENTOS INCAPAZES DE MODIFICAR O RESULTADO DO JULGAMENTO. CLARO INTENTO PROTELATÓRIO E DE REDISCUSSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. INSURGÊNCIA QUE DEVE SER MANIFESTADA PELA VIA RECURSAL PRÓPRIA. Os aclaratórios somente podem ser manejados para superar as específicas deficiências timbradas no art. 1.022 do CPC, não sendo meio adequado para redebater a causa ou inaugurar nova discussão em torno do acerto ou desacerto da decisão embargada. Incide a multa inscrita no § 2º do art. 1.026 do CPC quando desvirtuado o manejo dos aclaratórios, buscando reavivar o debate em torno do thema decidendum. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Embargos de Declaração n. 0064320-64.2011.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Jorge Luis Costa Beber, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 24-10-2018).
Dessarte, havendo manifestação coerente e inteligível na decisão guerreada acerca do tema em debate, e inocorrente qualquer contrariedade, obscuridade ou omissão, os aclaratórios não merecem ser acolhidos.
II – Do prequestionamento:
Com efeito, o pedido de manifestação para fins de prequestionamento é impróprio, porquanto as questões relacionadas ao objeto do reclamo foram decididas consoante as razões e fundamentos acima expostos.
Imperioso ressaltar que o Julgador não está obrigado a discorrer sobre todas as matérias e os dispositivos prequestionados e apontados pelas partes durante o trâmite da lide e seus debates, bastando que as decisões proferidas sejam fundamentadas de forma satisfatória, em cumprimento à ordem prevista no art. 93, IX, da Constituição Federal.
Para além do já exposto, descabido o pedido para prequestionar a matéria ventilada, uma vez que a problemática, ainda que de forma implícita, foi suficientemente abordada pelo Juízo de primeiro grau e reexaminada por este Órgão Colegiado, considerando-se, portanto, incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, em consonância com o disposto no art. 1.025 do CPC, razão pela qual o pleito em questão também deve ser rejeitado. 
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer dos embargos de declaração e rejeitá-los, conforme fundamentação.

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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Agravo de Instrumento Nº 5041557-67.2022.8.24.0000/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5017170-45.2020.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

EMBARGANTE: BANCO RODOBENS S.A.

EMENTA

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM TUTELA DE URGÊNCIA. DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EM FAVOR DO AUTOR.  RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO.
INSURGÊNCIA DA PARTE DEMANDADA.
ALEGADAS OMISSÃO E CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO VERGASTADO. ARGUMENTO DE AUSÊNCIA DE CARACTERIZAÇÃO DE RELAÇÃO CONSUMERISTA ENTRE AS PARTES. NÃO ACOLHIMENTO. DEMANDANTE QUE SE APRESENTA COMO CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO ANTE SUA VULNERABILIDADE FRENTE À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA. POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ONUS PROBANDI NO CASO. TESE DE MÉRITO JÁ APRECIADA NA DECISÃO COMBATIDA. EVIDENCIADO O INTUITO DE REDISCUTIR MATÉRIA JÁ SUBMETIDA AO CRIVO DO COLEGIADO. AUSÊNCIA DAS MÁCULAS PREVISTAS NO ART. 1.022 DO CPC.
PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA SUSCITADA NO RECURSO. JULGADOR QUE NÃO ESTÁ ADSTRITO À ANÁLISE EXAUSTIVA DA LEGISLAÇÃO E DA JURISPRUDÊNCIA APONTADAS. INTELIGÊNCIA DO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DO ART. 1.025 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PLEITO REJEITADO.
EMBARGOS CONHECIDOS E REJEITADOS.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 7ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer dos embargos de declaração e rejeitá-los, conforme fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 30 de março de 2023.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ROBERTO DA SILVA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3122108v5 e do código CRC 35fee3b6.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ROBERTO DA SILVAData e Hora: 10/4/2023, às 17:51:54

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 30/03/2023

Agravo de Instrumento Nº 5041557-67.2022.8.24.0000/SC

INCIDENTE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

PRESIDENTE: Desembargadora HAIDÉE DENISE GRIN

PROCURADOR(A): ANGELA VALENCA BORDINI
AGRAVANTE: BANCO RODOBENS S.A. ADVOGADO(A): RICARDO GAZZI (OAB SP135319) ADVOGADO(A): EZAIR JOSÉ MEURER JUNIOR (OAB SC024866) ADVOGADO(A): BYANCA SOUZA MATTOS (OAB SC057829) AGRAVADO: RUDNEY GUARNIERI MARCONDES ADVOGADO(A): ALLAN BERTOLDI (OAB SC024484) ADVOGADO(A): LUIZ FILIPE MOSER CARLINI (OAB SC024485)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual do dia 30/03/2023, na sequência 218, disponibilizada no DJe de 13/03/2023.
Certifico que a 7ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 7ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E REJEITÁ-LOS, CONFORME FUNDAMENTAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA
Votante: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVAVotante: Desembargador OSMAR NUNES JÚNIORVotante: Desembargador ÁLVARO LUIZ PEREIRA DE ANDRADE
TIAGO PINHEIROSecretário

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