Consumidor por equiparação e inversão do ônus da prova

Consumidor por equiparação e inversão do ônus da prova. Não há falar em descabimento da inversão do ônus probatório com base na legislação de consumo quando se está diante da figura do consumidor por equiparação.

Processo: 5041557-67.2022.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Carlos Roberto da Silva
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Sétima Câmara de Direito Civil
Julgado em: 24/11/2022
Classe: Agravo de Instrumento

Agravo de Instrumento Nº 5041557-67.2022.8.24.0000/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5017170-45.2020.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

AGRAVANTE: BANCO RODOBENS S.A. AGRAVADO: RUDNEY GUARNIERI MARCONDES

RELATÓRIO

Banco Rodobens S.A. interpôs recurso de agravo de instrumento contra decisão interlocutória (evento 103 dos autos de origem) proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Jaraguá do Sul que, na ação de obrigação de fazer com pedido liminar autuada sob o n. 5017170-45.2020.8.24.0036, movida em seu desfavor por Rudney Guarnieri Marcondes, deferiu o pedido de inversão do ônus probatório em favor da parte autora.
Para melhor elucidação da matéria debatida nos autos, transcreve-se a fundamentação da decisão recorrida:
IV – DA DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA:
Tendo em vista que a relação jurídica travada entre as partes submete-se às disposições protetivas no Código de Defesa do Consumidor (CDC, art. 3, § 2º) e presente a verossimilhança das alegações contidas na inicial, com fundamento no art. 6º, VIII, do CDC, inverto o ônus da prova em favor da parte autora-consumidora. (Grifos no original).
Em suas razões recursais (evento 1), a parte agravante sustentou que “o Banco Rodobens, ora Agravante, nunca estabeleceu com o Agravado qualquer relação jurídica, muito menos relação de consumo que justifique a inversão do ônus probante em prejuízo do Banco Rodobens”.
Aduziu que “não obstante tal fato, ocorre que conforme as regras consumeristas, a inversão do ônus da prova não incide de forma automática. Depende da constatação de um dos dois requisitos, quais sejam: verossimilhança das alegações autorais ou sua hipossuficiência”.
Alegou, ainda, que “além de não estarem configurados tais requisitos, sequer consta também o pedido específico na exordial para inversão do ônus probatório, revelando-se completamente descabida, portanto, a concessão do benefício da inversão do ônus da prova em favor do Agravado no presente caso”.
Requereu a concessão de efeito suspensivo em relação à decisão agravada para suspender a inversão do ônus probatório e, por fim, a reforma do decisum hostilizado para reconhecer a “impossibilidade de que seja invertido o ônus da prova”.
Recebido o inconformismo, foi indeferido o pedido de efeito suspensivo em relação à decisão combatida (evento 6).
Seguiu-se a intimação da parte agravada, que apresentou a respectiva resposta e pugnou a manutenção do decisum (evento 16). Após, vieram os autos conclusos para julgamento.
Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu o pedido de inversão do ônus probatório em prol da parte autora.
Consigna-se que a hipótese recursal em estudo tem previsão expressa no art. 1.015, XI, do CPC.
Portanto, por ser cabível, tempestiva e preencher os demais requisitos de admissibilidade, defere-se o processamento da insurgência em análise.
Cumpre enfatizar que em decorrência de previsão legal e sedimentação jurisprudencial, “o agravo de instrumento é via adequada para analisar o acerto ou desacerto da decisão hostilizada, não se destinando, nos estritos limites do efeito devolutivo, apreciar matéria não deliberada na instância de primeiro grau, sob pena de incorrer em supressão de instância” (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2015.022168-6, de Joinville, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. 25-8-2015).
O objeto recursal cinge-se em analisar se estão presentes os requisitos legais a autorizar correção da decisão que determinou a inversão do ônus da prova, e sobre tal ponto debruçar-se-á a presente decisão.
Adianta-se, desde já, que o recurso não comporta acolhimento.
Com efeito, tratando-se de pleito suspensivo no intuito de, no mérito, revogar a decisão recorrida, cumpria observar preliminarmente os requisitos do art. 995, parágrafo único, do CPC, cuja redação preceitua: “A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso”.
Como cediço, a “suspensão da decisão recorrida por força de decisão judicial está subordinada à demonstração da probabilidade de provimento do recurso (probabilidade do direito alegado no recurso, o fumus boni iuris recursal) e do perigo na demora (periculum in mora)”. (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1055-1056).
Portanto, dois eram os requisitos necessários para a concessão da medida de urgência: a probabilidade do direito, que é a plausibilidade dos fatos narrados na peça pórtica e que justificam a sua proteção, e o perigo de dano, entendido como a possibilidade de a demora comprometer a realização imediata ou futura do direito. 
Feito o introito, tem-se que não estavam presentes, no caso em estudo, os requisitos suprarreferidos, razão pela qual deve ser confirmada a decisão liminar deste recurso e a decisão objurgada, conforme a seguir se fundamentará.
Porque atuais e pertinentes os argumentos já lançados na decisão monocrática proferida nestes autos (evento 6), a fim de se evitar tautologia, transcreve-se parte dessa fundamentação para subsidiar o desprovimento, no mérito, do presente reclamo:
Volvendo ao caso concreto, adianta-se que não se evidencia em relação ao pedido de efeito suspensivo formulado a probabilidade do direito.
Explica-se.
No caso dos autos, ainda que não se vislumbre relação negocial direta entre agravante e parte autora, verifica-se a provável existência de cadeia de fornecimento entre o polo passivo da presente demanda, já que o recorrente, na condição de instituição bancária, supostamente teria realizado empréstimo de valores para a construtora corré (no intuito de edificar o empreendimento em questão), de modo que esta, posteriormente, alienou as correspondentes unidades autônomas aos consumidores (onde o demandante se enquadra).
Em face do acima descrito, verifica-se, ainda que em sede de cognição sumária, que parece existir relação de consumo entre as partes, uma vez que o banco recorrente se enquadra na figura de fornecedor e, igualmente, a parte autora é nítida consumidora.
Pontua-se que este Tribunal já entendeu em tal sentido quando analisou caso semelhante envolvendo a mesma situação e parte recorrente:
PROCESSUAL CIVIL – TUTELA DE URGÊNCIA – IMÓVEL – AVERBAÇÃO À MARGEM DA MATRÍCULA – REQUISITOS AUTORIZADORES (CPC, ART. 300) – PRESENÇA – MANUTENÇÃO DO DECISUM – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – CDC – CONSUMIDOR EQUIPARADO – POSSIBILIDADE1 Presentes a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, deve ser mantida a tutela de urgência para determinar a averbação da existência da demanda junto à matrícula do imóvel objeto da lide.2 Não há falar em descabimento da inversão do ônus probatório com base na legislação de consumo quando se está diante da figura do consumidor por equiparação. Mormente quando isso resulta apenas na obrigação de apresentar documentos e provas que estejam em poder do fornecedor. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5022476-69.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 06-07-2021).
Ademais, observa-se que o recorrido expressamente requereu a inversão do ônus probatório em sua petição inicial (Evento 1, INIC1, p. 16 dos autos de origem), fato que diferencia os presentes autos da situação existente em precedente judicial trazido pelo recorrente (Agravo de Instrumento n. 5061488-90.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rosane Portella Wolff, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 10-03-2022).
Em conclusão, tem-se que o autor se apresenta como consumidor por equiparação e possui aparente vulnerabilidade jurídica, técnica e econômica perante a instituição financeira agravante, o que é suficiente para que seja mantida incólume a decisão que deferiu a inversão do ônus da prova em favor da parte autora.
Nesse contexto, tendo como base a fundamentação acima, observa-se que a parte insurgente não logrou êxito em demonstrar o alegado desacerto da decisão recorrida, porquanto ausente a verossimilhança de suas alegações.
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento, conforme fundamentação.

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Agravo de Instrumento Nº 5041557-67.2022.8.24.0000/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5017170-45.2020.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

AGRAVANTE: BANCO RODOBENS S.A. AGRAVADO: RUDNEY GUARNIERI MARCONDES

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM TUTELA DE URGÊNCIA. DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EM FAVOR DO AUTOR.
INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ.
TESE DE INVIABILIDADE DE INVERSÃO DO ONUS PROBANDI. REJEIÇÃO. DEMANDANTE QUE SE APRESENTA COMO CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. VULNERABILIDADE TÉCNICA, JURÍDICA E ECONÔMICA DA PARTE REQUERENTE FRENTE À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA. DECISÃO MANTIDA.
“Não há falar em descabimento da inversão do ônus probatório com base na legislação de consumo quando se está diante da figura do consumidor por equiparação. Mormente quando isso resulta apenas na obrigação de apresentar documentos e provas que estejam em poder do fornecedor” (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5022476-69.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 06-07-2021).
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 7ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, conforme fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 24 de novembro de 2022.

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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 24/11/2022

Agravo de Instrumento Nº 5041557-67.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

PRESIDENTE: Desembargador ÁLVARO LUIZ PEREIRA DE ANDRADE

PROCURADOR(A): PAULO RICARDO DA SILVA
AGRAVANTE: BANCO RODOBENS S.A. ADVOGADO: RICARDO GAZZI (OAB SP135319) ADVOGADO: EZAIR JOSÉ MEURER JUNIOR (OAB SC024866) ADVOGADO: BYANCA SOUZA MATTOS (OAB SC057829) AGRAVADO: RUDNEY GUARNIERI MARCONDES ADVOGADO: ALLAN BERTOLDI (OAB SC024484) ADVOGADO: LUIZ FILIPE MOSER CARLINI (OAB SC024485)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual do dia 24/11/2022, na sequência 204, disponibilizada no DJe de 07/11/2022.
Certifico que a 7ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 7ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO, CONFORME FUNDAMENTAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA
Votante: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVAVotante: Desembargador OSMAR NUNES JÚNIORVotante: Desembargador ÁLVARO LUIZ PEREIRA DE ANDRADE
TIAGO PINHEIROSecretário

Fonte: TJSC

Imagem Freepik

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