Fornecimento de energia elétrica: construção irregular. Ainda que residências vizinhas possuam acesso à energia elétrica, é certo que “a existência de outras edificações em situação semelhante e destinatárias do serviço não é argumento idôneo para tolerar a irregularidade da construção, pois os abusos e as violações da lei devem ser coibidos, não imitados. […]”. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0010885-74.2016.8.24.0000, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. em 1-8-2017).
Processo: 5069480-34.2023.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Diogo Pítsica
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público
Julgado em: 14/12/2023
Classe: Agravo de Instrumento
Agravo de Instrumento Nº 5069480-34.2023.8.24.0000/SC
RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA
AGRAVANTE: GEOMAR JOSE UROSA AGRAVADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A.
RELATÓRIO
O instrumental impele decisão que, na “ação de obrigação de fazer”, indeferiu a antecipação da tutela, nos termos adjacentes (Evento 5, 1G):
9. Em análise perfunctória dos autos, não se tem demonstração da data da construção da edificação, tampouco da alegada consolidação da área em que se insere, o que desautoriza, por ora, conferir à parte requerente o serviço pretendido.
10. Assim, indefiro a tutela de urgência.
Irresignado, Geomar Jose Urosa recorreu. Argumentou que: a) “a área conhecida como “Baixada dos Fortes”, localizada no Bairro Parques das Palmeiras, local onde se localiza a residência do requerente, está em processo de regularização”; b) “a casa da parte autora se encontra em área ocupada predominantemente por população de baixa renda”; c) “não se mostra razoável que, a despeito da posse consolidada, inviabilize o direito constitucional de moradia e viole a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana”; d) “os vizinhos da parte autora possuem fornecimento de energia elétrica”; e) “as exigências não se aplicam nas hipóteses de áreas de preservação permanente ou urbanas de ocupação consolidada, assim como em imóveis que já eram devidamente atendidos pela concessionária” e f) “o fornecimento de luz é um serviço público essencial, devendo ser adequado (art. 6º, da Lei n. 8987/95), indispensável para a vida em sociedade, e inerente à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III, da Constituição), que é fundamento da República Federativa do Brasil” (Evento 1, 2G).
Ao final, pleiteou (Evento 1, 2G):
a. A concessão da antecipação de tutela da pretensão recursal, nos termos do inciso I do Art. 1.019 do Novo Código de Processo Civil;
b. A intimação da agravada, na pessoa de seus respectivos representantes legais, conforme dispõe o artigo 1.019, inciso II, do CPC, para que respondam ao presente recurso;
c. Ao final, seja conhecido e provido o presente recurso de agravo de instrumento, com a reforma da r. decisão lançada no ev. 5 e, por consequência, determinar o cumprimento urgente e imediato da obrigação de fazer, consistente no fornecimento de luz ao agravante, com fixação de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), ou outro valor que entender adequado, sem prejuízo de medidas outras que visem o resultado prático equivalente; e,
d. A intimação desta Defensoria Pública para atuar na defesa dos interesses da agravante em 2º grau de jurisdição;
Indeferida a tutela antecipada recursal (Evento 12, 2G), propiciou-se intimação para contrarrazões (Eventos 13, 2G).
É o relatório.
VOTO
Entre seus valorosos ensinamentos, o multifacetado Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda registrou heurístico exemplo às bases analíticas das pretensões recursais:
A pretensão recursal está para a pretensão à tutela jurídica como o processo para o direito pré-processual. Aquela surge, porque se exerceu essa. Se não havia essa, aquela existe para que se declare não existir essa. Por onde se vê que a criação da relação jurídica, que começa entre o autor e o Estado, e pode ir até o réu (angularização), permite que se traga à balha, em recurso, a própria inexistência da pretensão à tutela jurídica; mais ainda: a própria existência ou a validade da relação jurídica processual.
[…]
Nem sempre as resoluções judiciais – sentenças, decisões ou despachos – são isentas de faltas ou defeitos quanto ao fundo, ou sem infração das regras jurídicas processuais, concernentes à forma, ao procedimento. Desinteressar-se-ia o Estado da realização do seu direto material e formal, se não desse ensejo à correção de tais resoluções defeituosas, ou confiaria demasiado na probabilidade de acerto do juiz singular, ou do tribunal de inferir instância. Afastando esse perigo e aquele descaso, o Estado admite, de regra, o recurso, que implica reexame do caso em todos os seus elementos, ou só em alguns deles. (MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil: Tomo VII 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 1-2).
No que é pertinente à normatividade, a lei adjetiva civil assim preconiza pelo artigo 1.015:
Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:
I – tutelas provisórias;
II – mérito do processo;
III – rejeição da alegação de convenção de arbitragem;
IV – incidente de desconsideração da personalidade jurídica;
V – rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação;
VI – exibição ou posse de documento ou coisa;
VII – exclusão de litisconsorte;
VIII – rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio;
IX – admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;
X – concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução;
XI – redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º ;
XII – (VETADO);
XIII – outros casos expressamente referidos em lei.
Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.
Demais disso, o magistério doutrinário contribui ao exame das hipóteses de cabimento do recurso:
No sistema recursal criado pelo Código de Processo Civil de 2015 é excluído o agravo retido e o cabimento do agravo de instrumento está limitado às situações previstas em lei. O art. 1.015, caput, do CPC admite o cabimento do recurso contra determinadas decisões interlocutórias, além das hipóteses previstas em lei, significando que o rol legal de decisões interlocutórias recorríveis por agravo de instrumento é restritivo, mas não o rol previsto no art. 1.015 do CPC, considerando a possibilidade de o próprio Código de Processo Civil, bem como leis extravagantes, previrem outras decisões interlocutórias impugnáveis pelo agravo de instrumento que não estejam estabelecidas pelo disposto legal.
[…]
As decisões interlocutórias que não puderem ser impugnadas pelo recurso de agravo de instrumento não se tornam irrecorríveis, o que representaria nítida ofensa ao devido processo legal. Essas decisões não precluem imediatamente, devendo ser impugnadas em preliminar de apelação ou nas contrarrazões desse recurso, nos termos do art. 1.009, §1º, do CPC. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 13. ed. São Paulo: Juspodivm, 2021, p. 1676-1677)
A contenda sub examine acomoda-se à intelecção do inciso I, do dispositivo supraepigrafado, adequando-se, portanto, à via eleita.
O cerne do debate reside na ligação de energia elétrica em imóvel irregular, no Município de Chapecó, situado em área majoritariamente ocupada por pessoas de baixa renda.
A pretensão foi integralmente rechaçada na apreciação do pedido liminar, cujos termos reitero, a fim de evitar tautologia (Evento 12, 2G):
Conquanto a jurisprudência do TJSC admita, “‘excepcionalmente, o fornecimento desses serviços quando, no caso concreto, prevalecer o princípio da dignidade da pessoa humana e da isonomia, especialmente em casos nos quais a edificação está inserida em área urbana consolidada’ (rel. Des. Carlos Adilson Silva)”1, a recusa da concessionária se afigura legitima na hipótese sub examine.
Isso porque, embora o agravante defenda que a localidade está “em processo de regularização” e as residências vizinhas possuam acesso à energia elétrica, “a existência de outras edificações em situação semelhante e destinatárias do serviço não é argumento idôneo para tolerar a irregularidade da construção, pois os abusos e as violações da lei devem ser coibidos, não imitados. […]”. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0010885-74.2016.8.24.0000, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. em 1-8-2017).
O juízo a quo indeferiu a liminar pretendida com fulcro no art. 3º da Lei Municipal n 659/2019, que estabeleceu limite temporal para fornecimento de energia em imóveis situados em núcleos urbanos informais:
Art. 3º Será concedida a Certidão de Existência de Imóvel, que trata esta Lei Complementar, para as edificações residenciais unifamiliares nos seguintes casos:
I – Edificações erigidas em imóveis urbanos, oriundos de parcelamentos de solos regulares, anteriores a 22 de dezembro de 2014, data da publicação da Lei Complementar Municipal nº 546, 22 de dezembro de 2014 – Código de Obras do Município de Chapecó;
II – Edificações erigidas em imóveis urbanos, oriundos de parcelamentos de solos irregulares, caracterizados como núcleos urbanos informais consolidados, anteriores a 22 de dezembro de 2016, conforme disposto no §2º do art. 9º, da Lei Federal nº 13.465, de 11 de Julho de 2017 – Lei da Regularização Fundiária Urbana e Rural;
III – Edificações erigidas em imóveis rurais sem fins de urbanização, conforme definição constante no inciso I do art. 4º, da Lei Federal nº 4.504, de 30 de novembro de 1964 – Estatuto da Terra, independente do tempo de construção.
Na atual quadra processual, não há qualquer elemento probatório que afaste a aplicação do aludido dispositivo legal, visto que o agravante passou a exercer posse do imóvel em data posterior a 22-12-2016 – mais precisamente, em 11-1-2023 (Evento 1, Contrato 5, 1G).
Não só isso, verifica-se que a recusa da concessionária de serviço público foi pautada na existência de ação civil pública (n. 0900101-22.2017.8.24.0018) que proíbe a ligação de energia elétrica sem documentação regular (Evento 1, Resposta 8, 1G):
Cabível aqui destacar que no município de Chapecó a Celesc está proibida de efetivar novas ligações sem prévia apresentação de alvará de construção ou de habite-se, conforme Ação Civil Pública nº 0900101-22.2017.8.24.0018/SC. Ainda, nos casos de áreas consolidadas ocupadas predominantemente por população de baixa renda, a Prefeitura emite a Certidão de Existência de Imóvel.
A sentença encartada na mencionada ação civil pública, confirmada neste grau recursal, condicionou expressamente a ligação de energia em construções irregulares, ocupadas por pessoas de baixa renda, à prévia autorização da prefeitura com fito de frear urbanização desregulada.
O acórdão de relatoria do eminente Desembargador Vilson Fontana foi assim ementado:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA CELESC E DO PARQUET. CELESC IMPEDIDA DE INSTALAR NOVAS LIGAÇÕES SEM APRESENTAÇÃO DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO OU HABITE-SE. ALEGADA AUSÊNCIA DE OBRIGAÇÃO LEGAL E VIOLAÇÃO À COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. ARGUMENTO IMPROFÍCUO. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA PELA DEFESA E PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE (CF, ART. 225). ART. 27 DA RESOLUÇÃO 414 DA ANEEL. VERIFICADA INEXECUÇÃO DAS POLÍTICAS AMBIENTAIS DA PRÓPRIA EMPRESA. MEDIDA NECESSÁRIA PARA FREAR A URBANIZAÇÃO DESREGULADA. AUSÊNCIA DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE HUMANA E DA ISONOMIA. DISPENSA DE APRESENTAÇÃO DE ALVARÁ E/OU HABITE-SE EM CARÁTER EXCEPCIONAL, NOS CASOS DE ASSENTAMENTOS IRREGULARES OCUPADOS POR POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA, DESDE QUE SOB SOLICITAÇÃO OU ANUÊNCIA EXPRESSA DO MUNICÍPIO, NOS TERMOS DO ART. 52 DA RESOLUÇÃO 414 DA ANEEL. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.(TJSC, Apelação n. 0900101-22.2017.8.24.0018, rel. Des. Vilson Fontana, Quinta Câmara de Direito Público, j. 05-05-2022).
Nota-se que a orientação ao agravante pela Celesc se alinha ao previamente decidido nesta instância (Evento 1, Resposta 8, 1G):
Diante deste contexto, orientamos a consumidora a buscar a Diretoria de Habitação e Regularização Fundiária para verificar a situação do seu imóvel perante a Prefeitura e, na posse do alvará ou certidão da prefeitura, a mesma pode dirigir-se ao nosso atendimento pa5ra efetuar seu pedido de ligação.
Em demandas similares oriundas do Município de Chapecó, outra não é a conclusão agasalhada por esta Corte Estadual:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DOS AUTORES.INAPLICABILIDADE DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 659/2019, ANTE A COMPETÊNCIA DA UNIÃO, PARA LEGISLAR SOBRE ENERGIA ELÉTRICA. TESE NÃO VEICULADA NA PEÇA VESTIBULAR OU MESMO EM RÉPLICA. INOVAÇÃO RECURSAL. CONHECIMENTO OBSTADO.AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, DE QUE O IMÓVEL ESTARIA INSERIDO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. TESE ARREDADA. RESPOSTA A REQUERIMENTO DOS AUTORES, EMITIDA PELO MUNICÍPIO DE CHAPECÓ E COLACIONADA PELOS PRÓPRIOS, ATESTANDO QUE O IMÓVEL SE LOCALIZA EM APP E NEGANDO O PLEITO DE EMISSÃO DE CERTIDÃO DE REGULARIDADE, PARA SER APRESENTADA À CELESC. DESCONSTITUIÇÃO DO DOCUMENTO, QUE COMPETIA AOS AUTORES, PERANTE O ENTE MUNICIPAL. EDIFICAÇÃO, ADEMAIS, DESPROVIDA DE ALVARÁ OU HABITE-SE. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPELIR A CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO, AO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. RECUSA PERTINENTE. PRECEDENTES. DECISUM MANTIDO. APELO SOB A ÉGIDE DO CPC/15. ESTIPÊNDIOS RECURSAIS. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 85, §§ 1° E 11. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM BENEFÍCIO DO PATRONO DA PARTE RECORRIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5028396-33.2022.8.24.0018, rela. Desa. Bettina Maria Maresch de Moura, Terceira Câmara de Direito Público, j. 31-10-2023).
E:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. LIGAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DA AUTORA.CERCEAMENTO. PERÍCIA TÉCNICA. PROVA DISPENSÁVEL. LAUDO INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR CONSOLIDAÇÃO URBANA. AUSÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS CAPAZES DE INDICIAR O ADENSAMENTO. PRELIMINAR RECHAÇADA.FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. IRREGULARIDADE DA OCUPAÇÃO. IMÓVEL EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. CONSOLIDAÇÃO URBANA NÃO EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO A AUTORIZAR A EXCEPCIONAL DISPONIBILIZAÇÃO DOS PRÉSTIMOS. REQUISITOS IMPOSTOS PELA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 659/2019, DE CHAPECÓ, NÃO REVELADOS. RECUSA LEGÍTIMA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. MANUTENÇÃO DO DECISUM.PREQUESTIONAMENTO. IMPERTINÊNCIA.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.(TJSC, Apelação n. 5006949-23.2021.8.24.0018, rel. Des. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. 27-10-2022).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO COMINATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PEDIDO DE LIGAÇÃO DE UNIDADE CONSUMIDORA À REDE DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA E DE ESGOTAMENTO SANITÁRIO. RECUSA PELA CASAN EM RAZÃO DA NÃO APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO DE EXISTÊNCIA DO IMÓVEL, DE TÍTULO DE POSSE OU PROPRIEDADE E DE LICENÇA E ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO DA RESIDÊNCIA. LIMINAR NEGADA. INEXISTÊNCIA DE PLAUSIBILIDADE DO DIREITO. AUTORA QUE, NA SEARA ADMINISTRATIVA E NA INSTÂNCIA JUDICIAL, NÃO SE DESINCUMBIU DE APRESENTAR CERTIDÃO DE EXISTÊNCIA DE IMÓVEL EM CONFORMIDADE COM A LEI COMPLEMENTAR N. 659/2019 DO MUNICÍPIO DE CHAPECÓ. AUSÊNCIA DE PERIGO DA DEMORA. DEMANDANTE QUE HABITA NO LOCAL POR MAIS DE OITO ANOS, SENDO PROVIDA DE ÁGUA PELA VIZINHANÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.(TJSC, Agravo de Instrumento n. 5006581-39.2019.8.24.0000, rel. Des. Rodrigo Collaço, Terceira Câmara de Direito Público, j. 02-06-2020).
Assim, não demonstrada a regularidade da construção e diante da recusa expressa do ente municipal (Evento 1, Resposta 6, 1G), “não se pode compelir as concessionárias dos serviços de água, esgoto e energia elétrica, a realizar a ligação das redes em edificação clandestina” (TJSC, Apelação n. 0318478-91.2015.8.24.0008, rela. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 20-07-2023).
Rememoro que os pressupostos estabelecidos no art. 300 do CPC (probabilidade de direito e perigo de dano) são cumulativos e a falta de um dos requisitos legais, por si só, esvazia a pretensão liminar.
O entendimento supraindicado deve ser confirmado.
Isso porque, em sede de reclamo instrumental, não se está discutindo o mérito exauriente da demanda, mas, em regra, requisitos legais aplicáveis à interlocutória, em cognição sumária e sem esgotar o cerne do litígio a ser analisado pelo juízo a quo.
Assim, ao reforçar que o recurso restringe-se ao acerto ou desacerto da decisão objurgada registro, na hipótese, não existirem reparos no decisum guerreado.
Além dos precedentes já destacados acima, envolvendo o mesmo ente municipal, inúmeros são os julgados catarinenses que albergam idêntica intelecção:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO AUTOR. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. QUESTÃO MERAMENTE DE DIREITO. CONJUNTO PROBATÓRIO DOCUMENTAL QUE SE MOSTROU SUFICIENTE À SOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA. INTELIGÊNCIA DO ART. 370, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. EDIFICAÇÃO DESPROVIDA DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO OU HABITE-SE. REQUISITOS ESPECÍFICOS IMPOSTOS PELA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 659/2019. APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO DE EXISTÊNCIA DE IMÓVEL. EXIGÊNCIA NÃO CUMPRIDA. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NA RECUSA DA CONCESSIONÁRIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.(TJSC, Apelação n. 5010669-61.2022.8.24.0018, rel. Des. Cid Goulart, Segunda Câmara de Direito Público, j. 14-11-2023).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA AUTORAL.FORNECIMENTO DE ÁGUA E DE ENERGIA ELÉTRICA. IMÓVEL SABIDAMENTE IRREGULAR. AUSÊNCIA DE HABITE-SE. RECUSA LEGÍTIMA DAS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇO PÚBLICO. BEM DESTINADO À MORADIA. HIPÓTESE QUE NÃO SE SOBREPÕE À NECESSÁRIA REGULARIDADE DA OCUPAÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.A distribuição de água e de energia elétrica é, na sociedade contemporânea, serviço essencial que deve ser prestado com continuidade. No entanto, é legítimo o ato da concessionária que recusa a disponibilização dos préstimos a imóvel irregular, sobretudo se não houver prova robusta da existência de alvará construtivo e habite-se, ainda que destinado para fins de moradia.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.(TJSC, Apelação n. 5002992-72.2022.8.24.0052, rel. Des. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. 24-08-2023).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA PROPOSTA CONTRA A SAMAE DE BLUMENAU E CELESC. PEDIDO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA E DE ENERGIA ELÉTRICA. LOTEAMENTO IRREGULAR (CLANDESTINO). EXORDIAL DESACOMPANHADA DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO E HABITE-SE. AUSÊNCIA DE PROVA DA REGULARIDADE DO PARCELAMENTO DO SOLO E DA EDIFICAÇÃO. RECUSA NO FORNECIMENTO LEGÍTIMA.1. É entendimento assente neste e. Tribunal que, não demonstrada a regularidade da ocupação, não se pode compelir as concessionárias dos serviços de água, esgoto e energia elétrica, a realizar a ligação das redes em edificação clandestina.2. No caso,a residência dos autores localiza-se na via transversal da Rua Vale do Selke, identificada como “Rua de Placa Amarela”, no município de Blumenau, considerada área irregular e não foi produziada prova da obtenção de autorização da administração municipal para a edificação.3. Logo, as apeladas não podem ser obrigadas a prestar o serviço de implantação da rede de distribuição de energia e de água.4. Uma vez reconhecida a legalidade da conduta das prestadoras de serviço, torna-se inviável a condenação ao pagamento de indenização por dano moral. 5. Sentença de improcedência mantida.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.(TJSC, Apelação n. 0318478-91.2015.8.24.0008, rela. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 20-07-2023).
Repito que, por força da ação civil pública n. 0900101-22.2017.8.24.0018, o fornecimento de energia elétrica na localidade está condicionado à documentação regular ou certidão de autorização expressa da Prefeitura Municipal.
À vista dessas considerações, ausente a probabilidade jurídica do pedido, não vislumbro argumentum capaz de derruir o crivo do decisório de primeiro grau.
Imperiosa a manutenção da decisão verberada.
Inviável a fixação de honorários recursais, porque somente serão exigíveis quando preenchidos simultaneamente os requisitos cabíveis (STJ, AgInt no AREsp n. 2.139.057/DF, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 13-2-2023).
Voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Documento eletrônico assinado por DIOGO NICOLAU PÍTSICA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 4210189v6 e do código CRC 462747ed.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): DIOGO NICOLAU PÍTSICAData e Hora: 15/12/2023, às 13:46:29
1. TJSC, Apelação n. 5011889-31.2022.8.24.0039, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 18-04-2023.
Agravo de Instrumento Nº 5069480-34.2023.8.24.0000/SC
RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA
AGRAVANTE: GEOMAR JOSE UROSA AGRAVADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A.
EMENTA
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA EM IMÓVEL IRREGULAR. LIMINAR INDEFERIDA. MUNICÍPIO DE CHAPECÓ. ÁREA OCUPADA POR POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA. TESE INSUBSISTENTE. EXISTÊNCIA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO OU AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DA PREFEITURA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. RECUSA LEGÍTIMA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
1. É legítima a recusa da concessionária de serviço público em fornecer/ligar a energia elétrica em imóvel irregular, porquanto as construções erigidas sem autorização municipal não são revestidas de legalidade.
2. Não obstante a localidade esteja em processo de regularização, a negativa expressa do ente municipal em autorizar o fornecimento de energia elétrica no imóvel, em observância aos critérios estabelecidos na ação civil pública n. 0900101-22.2017.8.24.0018, afasta a abusividade na recusa da concessionária
3. Ainda que residências vizinhas possuam acesso à energia elétrica, é certo que “a existência de outras edificações em situação semelhante e destinatárias do serviço não é argumento idôneo para tolerar a irregularidade da construção, pois os abusos e as violações da lei devem ser coibidos, não imitados. […]”. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0010885-74.2016.8.24.0000, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. em 1-8-2017).
4. É assente na jurisprudência que “não se pode compelir as concessionárias dos serviços de água, esgoto e energia elétrica, a realizar a ligação das redes em edificação clandestina” (TJSC, Apelação n. 0318478-91.2015.8.24.0008, rela. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 20-07-2023).
5. Decisão mantida. Honorários recursais incabíveis.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 14 de dezembro de 2023.
Documento eletrônico assinado por DIOGO NICOLAU PÍTSICA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 4210190v8 e do código CRC 095d1604.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): DIOGO NICOLAU PÍTSICAData e Hora: 15/12/2023, às 13:46:29
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 14/12/2023
Agravo de Instrumento Nº 5069480-34.2023.8.24.0000/SC
RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA
PRESIDENTE: Desembargador DIOGO PÍTSICA
PROCURADOR(A): IVENS JOSE THIVES DE CARVALHO
AGRAVANTE: GEOMAR JOSE UROSA ADVOGADO(A): THIAGO SIMOES VIEIRA DE SOUZA (DPE) AGRAVADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 14/12/2023, na sequência 161, disponibilizada no DJe de 22/11/2023.
Certifico que a 4ª Câmara de Direito Público, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 4ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador DIOGO PÍTSICA
Votante: Desembargador DIOGO PÍTSICAVotante: Desembargador ODSON CARDOSO FILHOVotante: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI
JULIANA DE ALANO SCHEFFERSecretária
Fonte: TJSC
Imagem Freepik