Furto de veículo em estacionamento de supermercado

Disponibilizado aos consumidor o serviço de estacionamento, utilizado como meio de captação de clientes, cabe aos estabelecimentos comerciais a responsabilidade pela guarda e vigilância do patrimônio para excluir a responsabilização da fornecedora pelos infortúnios ocorridos no local, cuja ocorrência representa frustração da legítima expectativa estabelecida aos consumidores de que os bens se encontrariam protegidos.

Processo: 0308160-51.2018.8.24.0038 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Alex Heleno Santore
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Oitava Câmara de Direito Civil
Julgado em: 14/11/2023
Classe: Apelação Citações – Art. 927, CPC:

Apelação Nº 0308160-51.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ALEX HELENO SANTORE

APELANTE: EMPRESA CATARINENSE DE SUPERMERCADOS LTDA. APELADO: ARMINDO ADOLFO THEISEN (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação em que figura como parte apelante EMPRESA CATARINENSE DE SUPERMERCADOS LTDA. e como parte apelada ARMINDO ADOLFO THEISEN, interposto contra sentença proferida pelo juízo de origem nos autos n. 0308160-51.2018.8.24.0038.
Em atenção aos princípios da celeridade e economia processual (CF, art. 5º, inc. LXXVIII), adoto o relatório da sentença como parte integrante deste acórdão, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:
Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais proposta por Armindo Adolfo Theisen, em face de Empresa Catarinense de Supermercados Ltda – Fort Atacadista, partes qualificadas.
Asseverou a parte autora que em 03/02/2018 a filha e a esposa do autor dirigiram-se ao estabelecimento réu com o veículo GM-Kadett Ipanema, placas BNO-6634, de propriedade da autora, estacionando o referido automóvel nas dependências do estabelecimento réu. Ao retornar para o veículo poucas horas após, perceberam que o referido bem havia sido furtado. Narrou que foi realizada a lavratura de Boletim de Ocorrência. Por conta de tal fato, postulou a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos material e por danos morais. Requereu a inversão do ônus da prova. Juntou documentos (evento 1:2-9).
No evento 3 foi deferida a Justiça Gratuita à parte autora e determinada a citação da ré.
Devidamente citada (evento 7), a parte ré apresentou contestação (evento 13) em que impugnou a inversão do ônus da prova e postulou pela improcedência da inicial, diante da ausência de provas.
A parte autora apresentou réplica (evento 18) impugnando a contestação apresentada.
Proferida decisão de organização e saneamento (evento 21), foi deferida a inversão do ônus da prova, à luz do CDC, e designada audiência de instrução e julgamento. Na mesma decisão foi determinado que a parte ré trouxesse aos autos as gravações do circuito fechado de segurança.
Ao apresentar seu rol de testemunhas (evento 24), a parte ré informou que não possui as gravações referentes ao dia dos fatos.
Em audiência de instrução e julgamento (evento 223) foram ouvidas uma testemunha, uma informante e o preposto da parte ré.
Concedido prazo para alegações finais, as partes não se manifestaram (evento 230).
É o relatório.
Sentença (ev. 232.1): julgados procedentes os pedidos formulados na inicial, conforme dispositivo a seguir transcrito:
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão inicial, para:
I. CONDENAR a parte ré a ressarcir o autor no montante de R$ 6.723,00, valor devido pelo veículo GM-Kadett Ipanema GL 5P, gasolina, 1993/1994, placas BNO-6634, sobre o qual incidirá correção monetária (Súmula n. 43 do STJ), a partir da data do furto (03/02/2018), e juros de mora a contar da citação (18/05/2018), com fulcro no art. 405 do Código Civil;
II. CONDENAR a parte ré ao pagamento de R$ 15.000,00 em favor da parte autora, a título de indenização por danos morais, a ser acrescidas de correção monetária pelo INPC a contar do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e juros moratórios de 1% ao mês desde o evento danoso (Súmula 54 do STJ), adotando-se aqui a data de 03/02/2018 (evento 1:5, p. 3).
Condeno a parte ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% sobre o valor atualizado da condenação, em favor do Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, na forma do art. 4º, XXI, da Lei Complementar n. 80/94.
P.R.I.
Com o trânsito em julgado, arquive-se.
Opostos embargos de declaração (ev. 236.1), restaram acolhidos nos seguintes termos (ev. 250.1):
I. Trata-se de Embargos de Declaração opostos pela Empresa Catarinense de Supermercados, ao argumento de que a sentença de evento 232 possui contradição consistente na fixação de dois termos iniciais para os juros de mora e correção monetária das indenizações.
Recebidos os aclaratórios, a parte embargada se manifestou (evento 247).
É o breve relato.
Dispõe o Código de Processo Civil:
Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:
I – esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;
II – suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;
III – corrigir erro material.
Razão assiste à parte embargante no que tange a fixação do marco inicial dos juros moratórios incidentes sobre a condenação a título de indenização por danos morais.
Desta forma, o item II da parte dispositiva da sentença do evento 232 passa a contar com a seguinte redação:
“II. CONDENAR a parte ré ao pagamento de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) em favor da parte autora, a título de indenização por danos morais, sobre o qual incidirá correção monetária pelo INPC a contar da data do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e juros moratórios de 1% ao mês a contar da citação (18/05/2018), com fulcro no art. 405 do Código Civil;”
Ante o exposto, ACOLHO os embargos declaratórios opostos para reconhecer a contradição na forma supra.
II. Cumpra-se integralmente a sentença do evento 232, observando-se a retificação realizada acima.
III. P.R.I.
Razões recursais (ev. 258.1): requer a parte apelante: (a) a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais; (b) subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório por danos morais ao valor de R$5.000,00. 
Contrarrazões (ev. 262.1): a parte apelada, por sua vez, postula o desprovimento do recurso e o arbitramento de honorários advocatícios recursais.
É o relatório.

VOTO

1. ADMISSIBILIDADE
Preenchidos os pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.
2. MÉRITO
Trata-se de ação deflagrada com a pretensão de reconhecimento da responsabilidade civl objetiva da ré por furto de veículo ocorrido em suas dependências, com a condenação da parte demandada à indenização por danos materiais e morais.
Julgados procedentes os pedidos, o objeto do recurso interposto pela requerida consiste na reforma da sentença em razão da: [a] inexistência de ato ilícito sujeito à reparação indenizatória; [b] necessidade de redução do quantum indenizatório, ao fundamento de que o montante arbitrado se mostra exacerbado para reparar os danos morais experimentados.
2.1. Responsabilidade civil por ato ilícito
A recorrente, em suma, alega que “[…] não há elementos de prova mínimos para a condenação da Apelante na indenização por danos materiais e compensação por danos morais […]”.
A relação jurídica subjacente à lide consubstancia típica relação de consumo, dada a condição de fornecedora da apelante e do apelado como consumidor, atraindo a incidência dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor.
As relações jurídicas regidas pela legislação de proteção ao consumidor norteiam-se à luz do regime da responsabilidade civil objetiva, na esteira do art. 14 do CDC:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
A configuração do dever reparatório, em casos desta natureza, prescinde da comprovação do elemento subjetivo na conduta do fornecedor. Por consequência, para se impor a obrigação de indenizar, basta a evidência do ato ilícito, com a demonstração do nexo de causalidade do fato com a conduta do agente.
Satisfeitos tais pressupostos, o fornecedor arcará com os infortúnios de qualquer ordem ocasionados em prejuízo do consumidor, frisa-se, independentemente da comprovação de culpa.
O juízo da origem acolheu a pretensão, fundando as razões de decidir na responsabilidade objetiva da parte ré, em decorrência do furto do veículo do autor no estacionamento do estabelecimento comercial da demandada.
As razões consignadas na sentença proferida pelo juízo de primeiro grau adotaram solução adequada para o litígio, as quais passam a integrar os fundamentos do voto: 
[…]
Estreme de dúvidas o furto do veículo GM-Kadett Ipanema, placas BNO-6634, o que se encontra comprovado por meio do boletim de ocorrência (evento 1:5, p. 3-7), que, embora unilateral, é corroborado pelo comprovante de pagamento das compras realizadas na loja ré (evento 1:4, p. 5 e 1:5, p. 1-2), em data e hora compatíveis com o evento narrado.
Ouvido em Juízo (evento 223), o preposto da parte ré asseverou que o estabelecimento conta com câmeras de segurança, porém não soube dizer a direção em que tais câmeras estariam apontadas, informando que existem ângulos do estacionamento que não são abrangidos por estas. Narrou que as imagens do CFTV ficam armazenadas por aproximadamente 15 (quinze) dias e não soube informar por qual razão as imagens da data dos fatos não foi armazenada além do referido período.
A filha do autor, foi ouvida na qualidade de informante, asseverou que estava no estabelecimento réu na data dos fatos e que ali permaneceu por aproximadamente três horas. Ao chegar no local teria estacionado o veículo nas suas dependências e, ao final das compras, constatou que o veículo fora subtraído. Relatou que acionou os seguranças do estabelecimento, os quais ajudaram a procurar o veículo no estacionamento, sem sucesso todavia. Um dos funcionários lhe informou que não foi possível visualizar nas câmeras de segurança a ocorrência do furto. Acionou a Polícia Militar, que compareceu ao local, ainda que o funcionário da ré tenha afirmado que “não adiantava chamar a polícia”.
O Policial Militar Hugo Leonardo Pereira da Costa asseverou que atendeu a ocorrência, sendo que não chegou a verificar o CFTV da empresa ré, uma vez que foi informado que as imagens das câmeras de segurança não estavam disponíveis no momento e que não havia imagens da subtração.
Ora, de todo o exposto é possível concluir que a parte ré tem responsabilidade objetiva pelo furto ocorrido no interior do seu estabelecimento, o que é referendado pelo disposto no art. 6°, VIII, do CDC, por se tratar de falha de serviço no bojo de relação de consumo, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
No tocante ao quantum indenizatório, deve-se observar o valor da Tabela FIPE na data do sinistro, a qual se apresenta como indicativo ideal para sua fixação – por consistir em meio apto a demonstrar a extensão do dano (art. 944 do Código Civil). 
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina já deixou assentado: […]
Após consulta realizada na internet, constata-se que o valor do bem furtado (GM-Kadett Ipanema GL 5P, gasolina, 1993/1994) previsto na tabela FIPE e tendo como mês de referência fevereiro de 2018, data do infortúnio, era de R$ 6.723,00, valor sobre o qual incidirá correção monetária a partir da data do ocorrido e juros de mora a contar da citação.
Quanto ao pedido de indenização por danos morais, não se pode olvidar que o furto de veículo automotor em estacionamento de estabelecimento comercial, por si só, não é capaz de gerar dano moral, devendo ser examinadas as circunstâncias do caso concreto.
No caso em tela, verifica-se que a parte autora é pessoa idosa, atualmente com 82 anos de idade, e conforme se observa de documento trazido com a inicial (evento 1:7), à época dos fatos, fazia tratamento contra uma neoplasia. Além disso, asseverou em sua exordial que se utilizava do veículo para deslocamento a unidades de saúde, a fim de receber tratamento médico.
Com a subtração do veículo, teve que diligenciar formas alternativas para o referido deslocamento. Conforme informado em audiência de instrução e julgamento pela filha do autor (evento 223:2), após a subtração do veículo teve que pedir a familiares que realizassem o deslocamento do autor para tratamento médico e, na impossibilidade destes, foi necessário fazer uso de aplicativos de transporte.
Tal fato demonstra que o abalo psicológico causado ao autor, pela subtração do seu veículo, superou em muito a esfera do mero aborrecimento.
Dessa forma, está configurado o abalo moral suportado indevidamente pela parte autora.
Os precedentes deste Tribunal orientam a solução da matéria no sentido de que a empresa responde pela reparação de furto de veículo ocorrido em seu estacionamento quando comprovada a condição de consumidor [cliente] pela vítima do infortúnio:
APELAÇÃO CIVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. FURTO DE VEÍCULO NAS DEPENDÊNCIAS DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. TESE DE CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIROS E/OU DA VÍTIMA. INACOLHIMENTO. DANOS MATERIAIS CARACTERIZADOS. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.Os termos da Súmula 130 do STJ (“a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”), estabelece uma presunção quase que absoluta derivada da responsabilidade objetiva do dever de guarda e vigilância sobre os veículos em estacionamento disponibilizado aos clientes de seus serviços. (TJSC, Apelação n. 0302632-22.2015.8.24.0012, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Silvio Dagoberto Orsatto, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 04-08-2022 – grifou-se).
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. FURTO DE AUTOMÓVEL EM ESTACIONAMENTO DO SUPERMERCADO DA RÉ. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES.[…]PRETENSA REFORMA DA SENTENÇA. ALEGADA INEXISTÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO E AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. INSUBSISTÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE EVIDENCIA O FURTO DO VEÍCULO OCORRIDO NO ESTACIONAMENTO DA EMPRESA RÉ. COMPROVAÇÃO DE COMPRAS REALIZADAS NO SUPERMERCADO NO HORÁRIO RELATADO NO BOLETIM DE OCORRÊNCIA. ADEMAIS, BOLETIM DE OCORRÊNCIA QUE, EMBORA SE TRATE DE DOCUMENTO UNILATERAL, NÃO HÁ, NO CASO CONCRETO, QUALQUER CIRCUNSTÂNCIA QUE POSSA COLOCAR EM DÚVIDA A VERACIDADE DA NARRATIVA ANOTADA PELO POLICIAL CIVIL, ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBIA À RÉ, NOS TERMOS DO ART. 373, II, DO CPC. RÉ QUE POSSUI O DEVER DE ZELAR PELOS BENS DEIXADOS EM SUA RESPONSABILIDADE NO ESTACIONAMENTO DISPONIBILIZADO AOS SEUS CLIENTES. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 130 DO STJ. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. DEVER DE INDENIZAR O DANO MATERIAL CARACTERIZADO. […]RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.- “A EMPRESA QUE FORNECE ESTACIONAMENTO AOS VEÍCULOS DE SEUS CLIENTES RESPONDE OBJETIVAMENTE PELOS FURTOS, ROUBOS E LATROCÍNIOS OCORRIDOS NO SEU INTERIOR, UMA VEZ QUE, EM TROCA DOS BENEFÍCIOS FINANCEIROS INDIRETOS DECORRENTES DESSE ACRÉSCIMO DE CONFORTO AOS CONSUMIDORES, O ESTABELECIMENTO ASSUME O DEVER – IMPLÍCITO EM QUALQUER RELAÇÃO CONTRATUAL – DE LEALDADE E SEGURANÇA, COMO APLICAÇÃO CONCRETA DO PRINCÍPIO DA CONFIANÇA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 130 DO STJ” (STJ, RESP 1269691/PB, RELA. MINA. MARIA ISABEL GALLOTTI, REDATOR P/ ACÓRDÃO MIN. LUIS FELIPE SALOMÃO). (TJSC, Apelação n. 0303749-80.2017.8.24.0011, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rubens Schulz, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 01-07-2021 – grifou-se).
No caso concreto, é incontroverso o furto do veículo do autor nas dependências do estabelecimento comercial da demandada, com respaldo no boletim de ocorrência e no comprovante de pagamento das compras realizadas no dia e horário dos fatos (ev. 1.5).
O cupom fiscal é datado de 03/02/2018, às 20h, de modo que, apesar de não haver registro nominal do responsável pelas compras, o documento está em conformidade com o relato de CLÁUDIA THEISEN [filha do autor], registrado no boletim de ocorrência e no depoimento prestado como informante durante a audiência de instrução e julgamento (ev. 223.2).
Nesse contexto, o relato constante do boletim de ocorrência [na hipótese, há o registro do relato de Cláudia Theisen e de um dos policiais que atendeu a circunstância], mesmo constituindo prova unilateral, associado ao comprovante de realização de compras no estabelecimento, é suficiente para desincumbir o autor do ônus da prova [CPC, art. 373, I] relativa: [a] à condição de cliente [consumidor] do estabelecimento; [b] à ocorrência do evento [furto do veículo de sua propredade] nas dependências da ré, no dia e hora indicado como ocorrência dos fatos.
Nessas circunstâncias, caberia à empresa demandada a prova em sentido contrário para descontituir a presunção de veracidade da narrativa anotada pela autoridade policial ou de que o autor não possuiria a condição de consumidor.
Em juízo, o preposto da parte ré confirmou a presença de câmeras de monitoramento no estabelecimento, porém não soube informar para onde os equipamentos estariam apontadas, relatando a existência de ângulos do estacionamento não alcançados.
A disponibilidade das imagens colhidas no dia dos fatos poderia representar prova de circunstância impeditiva do direito alegado pelo autor, no sentido de comprovar a eventual ausência do veículo estacionado nas dependências do estabelecimento na data e hora indicadas como ocorrência do infortúnio.
O Policial Militar Hugo Leonardo confirmou o atendimento da ocorrência, e asseverou não ter verificado o CFTV da empresa ré, “uma vez que foi informado que as imagens das câmeras de segurança não estavam disponíveis no momento e que não havia imagens da subtração.” – ev. 232.1.
No mesmo sentido, a filha do autor confirmou sua presença no local e data dos fatos, deparando-se com a subtração do veículo ao retornar das compras no interior do estabelecimento, acrescentando a informação passada por um dos funcionários no sentido de impossibilidade de visualizar nas câmeras de segurança a ocorrência do furto (ev. 223.2).
À vista disso, a apelante não demonstrou a ausência do veículo no estacionamento, ou então que o furto não correu como narrado pela parte autora, prova de fácil produção pela circunstância de possuir sistema de monitoramento de câmeras no estabelecimento.
Logo, ausente a apresentação das imagens, a demandada deixou de produzir prova a seu encargo [CPC, art. 373, II].
Em conclusão, disponibilizado aos consumidor o serviço de estacionamento, utilizado como meio de captação de clientes, cabe aos estabelecimentos comerciais a responsabilidade pela guarda e vigilância do patrimônio para excluir a responsabilização da fornecedora pelos infortúnios ocorridos no local, cuja ocorrência representa frustração da legítima expectativa estabelecida aos consumidores de que os bens se encontrariam protegidos.
Nesse sentido, assim dispõe a Súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça: “a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”.
Desse modo, incontestável a responsabilidade objetiva da empresa ré em decorrência dos danos causados aos bens depositados no estacionamento disponibilizado aos clientes, situação que gera o dever de indenizar.
O recurso, no ponto, deve ser desprovido.
2.2. Quantum indenizatório dos danos morais
A parte apelante postula a redução do quantum indenizatório, ao fundamento de que a quantia arbitrada pelo juízo a quo se mostra exacerbada para reparar os danos morais experimentados.
O juízo da origem acolheu a pretensão declaratória, fundando as razões de decidir na utilização do veículo furtado para promover o deslocamento do autor para realização de tratamento continuado de saúde, o que expôs o demandante ao risco de interrupção dos cuidados contra moléstia grave [neoplasia].
No tocante à indenização por danos morais, a sentença recorrida arbitrou o quantum indenizatório nos seguintes termos (ev. 232.1):
No tocante ao quantum indenizatório, leva-se em conta a extensão do dano, a capacidade econômica das partes, o princípio da reparação integral (art. 944 do CC), a vedação ao enriquecimento indevido, o caráter repressivo, punitivo e preventivo do dano moral e, ainda, o critério bifásico adotado pelo STJ, bem como os parâmetros da proporcionalidade e da razoabilidade.
A par de tais considerações, revela-se adequada a quantia de R$ 15.000,00, a ser acrescida de correção monetária pelo INPC a contar do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e de juros moratórios de 1% ao mês desde o evento danoso (Súmula 54 do STJ), adotando-se aqui a data de 03/02/2018 (evento 1:5,p3).
O dano moral tem assento constitucional, nos termos do art. do art. 5º, V e X, da Carta da República, do qual derivam as previsões infraconstitucionais delineadas nos arts. 186, 187 e 927, todos do Código Civil.
À vista disso, para a configuração do dever de indenizar, necessária a demonstração de situação que ultrapasse o mero dissabor. Deve-se demonstrar que o abalo causado pelo ato ilícito transcende o direito à personalidade, afetando a intimidade, a honra e a imagem da pessoa.
A finalidade da indenização é impor ao causador do dano a reparação integral dos prejuízos experimentados, servindo, ainda, como método de prevenção para que o fornecedor seja estimulado a prevenir reiteração da conduta ilícita.
Para se estabelecer a quantia aplicável, deve ser levada em consideração a capacidade econômica dos envolvidos, ponderando-a aos fatos, sob o crivo da razoabilidade e proporcionalidade.
Os precedentes deste Tribunal orientam a solução da matéria no sentido de que, em casos como o presente, o quantum indenizatório arbitrado observa os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, frente as suas peculiaridades.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. FURTO DE OBJETOS EM VEÍCULO ESTACIONADO EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA DEMANDADA. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE QUE O FURTO NÃO TERIA OCORRIDO NO ESTACIONAMENTO DO SHOPPING. TESE RECHAÇADA. AUSÊNCIA DE PROVA SEGURA DE QUE A AUTORA TERIA DEIXADO O LOCAL E APENAS HORAS DEPOIS PERCEBIDO O OCORRIDO. FATOS NARRADOS NA EXORDIAL CORROBORADOS PELA PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL CONSTANTE NOS AUTOS. RELAÇÃO DE CONSUMO (CDC, ARTS. 3º, § 2º, E 14, CAPUT). RESPONSABILIDADE DA EMPRESA PELA REPARAÇÃO DOS PREJUÍZOS DECORRENTES DO EVENTO OCORRIDO EM SEU ESTACIONAMENTO. SÚMULA 130 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. OBRIGAÇÃO DE GUARDA E VIGILÂNCIA. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. AVENTADA A INEXISTÊNCIA DE DANOS MORAIS, MAS SIM MERO ABORRECIMENTO DO COTIDIANO. DESAPOSSAMENTO DOS BENS PESSOAIS, SOMADO À FALTA DE ASSISTÊNCIA PELA RÉ CAPAZ DE GERAR AFLIÇÕES E TRANSTORNOS. INTERRUPÇÃO DO CURSO NORMAL DA VIAGEM. FRUSTRAÇÃO EVIDENTE. ABALO ANÍMICO ADMITIDO NA HIPÓTESE. QUANTUM INDENIZATÓRIO. VALOR ARBITRADO COMPATÍVEL  COM OS PARÂMETROS ADOTADOS PELAS CÂMARAS DE DIREITO CIVIL DESTA CORTE, GUARDANDO O NECESSÁRIO CARÁTER PEDAGÓGICO E INIBIDOR AO CASO CONCRETO. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA AUTORA À PENALIDADE PROCESSUAL POR LITIGÂNICA DE MÁ-FÉ. HIPÓTESES DOS INCISOS DO ART. 80 DA LEI ADJETIVA CIVIL NÃO VERIFICADAS. TESE NÃO ACOLHIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.  (TJSC, Apelação n. 0010208-77.2013.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Felipe Schuch, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 24-06-2021).
No caso, observado que o r. juízo de primeiro grau estabeleceu a quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de quantum indenizatório, o montante é suficiente para reparar adequadamente o dano suportado.
O polo passivo do litígio é integrado por grande rede de supermercados, de forma que o montante arbitrado não representa enriquecimento ilícito da parte autora, nem prejudica a saúde financeira da demandada. 
Desse modo, no tocante ao montante indenizatório, a conclusão consignada na sentença proferida pelo juízo de primeiro grau deve ser mantida, por corresponder ao entendimento fixado na orientação jurisprudencial predominante nesta Corte.
Logo, em conclusão, no ponto, o recurso deve ser desprovido.
3. HONORÁRIOS RECURSAIS
Sobre os honorários recursais, o Superior Tribunal de Justiça fixou os requisitos cumulativos que devem estar presentes para viabilizar a fixação daqueles,  conforme o disposto no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. OMISSÃO CONFIGURADA. ACOLHIMENTO DOS EMBARGOS PARA SANAR O VÍCIO. CABIMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. REQUISITOS.I – Para fins de arbitramento de honorários advocatícios recursais, previstos no § 11 do art. 85 do CPC de 2015, é necessário o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos:1. Direito Intertemporal: deve haver incidência imediata, ao processo em curso, da norma do art. 85, § 11, do CPC de 2015, observada a data em que o ato processual de recorrer tem seu nascedouro, ou seja, a publicação da decisão recorrida, nos termos do Enunciado 7 do Plenário do STJ: “Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC”;2. o não conhecimento integral ou o improvimento do recurso pelo Relator, monocraticamente, ou pelo órgão colegiado competente;3. a verba honorária sucumbencial deve ser devida desde a origem no feito em que interposto o recurso;4. não haverá majoração de honorários no julgamento de agravo interno e de embargos de declaração oferecidos pela parte que teve seu recurso não conhecido integralmente ou não provido;5. não terem sido atingidos na origem os limites previstos nos §§ 2º e 3º do art. 85 do Código de Processo Civil de 2015, para cada fase do processo;6. não é exigível a comprovação de trabalho adicional do advogado do recorrido no grau recursal, tratando-se apenas de critério de quantificação da verba. […] [STJ. EDcl no AgInt no REsp n. 1.573.573/RJ. Relator: Min. Marco Aurélio Bellizze. Julgado em 04.04.2017].
Considerando o desprovimento do recurso interposto, a verba honorária recursal deve ser somada aos honorários advocatícios fixados na origem em 15% do valor da condenação, perfazendo o montante total de 17% do valor atualizado da condenação, a título de honorários, em favor do Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina. 
4. DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.

Documento eletrônico assinado por ALEX HELENO SANTORE, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 4118514v19 e do código CRC fc2905e2.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ALEX HELENO SANTOREData e Hora: 16/11/2023, às 15:57:20

Apelação Nº 0308160-51.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ALEX HELENO SANTORE

APELANTE: EMPRESA CATARINENSE DE SUPERMERCADOS LTDA. APELADO: ARMINDO ADOLFO THEISEN (AUTOR)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ. 
FURTO DE VEÍCULO OCORRIDO EM ESTACIONAMENTO DISPONIBILIZADO POR EMPRESA SUPERMERCADISTA. ALEGADA INEXISTÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO E AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. INSUBSISTÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE EVIDENCIA O ATO ILÍCITO OCORRIDO NO ESTACIONAMENTO DA RÉ. COMPROVAÇÃO DE COMPRAS REALIZADAS NO SUPERMERCADO EM HORÁRIO COMPATÍVEL AO RELATADO EM BOLETIM DE OCORRÊNCIA, CUJAS INFORMAÇÕES ESTÃO CORROBORADAS PELAS PROVAS COLHIDAS NOS AUTOS. CONDIÇÃO DE CONSUMIDOR COMPROVADA PELA VÍTIMA DO INFORTÚNIO. INEXISTÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIA CAPAZ DE AFASTAR A NARRATIVA  DA TESTEMUNHA POLICIAL OUVIDA EM JUÍZO. ÔNUS DA PROVA A RESPEITO DE FATO IMPEDITIVO DO DIREITO DO AUTOR QUE INCUMBIA À RÉ [ART. 373, II, CPC]. DEVER DA DEMANDADA DE ZELAR PELOS BENS DEIXADOS NO ESTACIONAMENTO DISPONIBILIZADO AOS  CLIENTES [STJ, SÚMULA 130]. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS EVIDENTE. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. SENTENÇA MANTIDA, NO PONTO. 
IRRESIGNAÇÃO NO TOCANTE AO VALOR INDENIZATÓRIO. MANUTENÇÃO DO QUANTUM ESTABELECIDO NA ORIGEM [R$ 15.000]. ABALO ANÍMICO CARACTERIZADO EM RAZÃO DO USO DO VEÍCULO FURTADO PARA DESLOCAMENTO DO AUTOR [COM 82 ANOS DE IDADE À ÉPOCA] À REALIZAÇÃO DE TRATAMENTO CONTRA NEOPLASIA. MONTANTE ARBITRADO QUE OBSERVA OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, DE ACORDO COM AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. 
SENTENÇA MANTIDA.  RECURSO DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 8ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 14 de novembro de 2023.

Documento eletrônico assinado por ALEX HELENO SANTORE, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 4118515v7 e do código CRC bd1e1ca6.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ALEX HELENO SANTOREData e Hora: 16/11/2023, às 15:57:20

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/11/2023

Apelação Nº 0308160-51.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ALEX HELENO SANTORE

PRESIDENTE: Desembargador ALEX HELENO SANTORE

PROCURADOR(A): PAULO RICARDO DA SILVA
APELANTE: EMPRESA CATARINENSE DE SUPERMERCADOS LTDA. ADVOGADO(A): Silvio Noel de Oliveira Junior (OAB SC008579) ADVOGADO(A): Thayana Jackeline Daros Abreu de Oliveira (OAB SC030244) ADVOGADO(A): LUANA BETANCOR (OAB SC034586) APELADO: ARMINDO ADOLFO THEISEN (AUTOR) ADVOGADO(A): RODRIGO SCARPELLINI GONCALVES DE FREITAS (DPE)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual do dia 14/11/2023, na sequência 38, disponibilizada no DJe de 30/10/2023.
Certifico que a 8ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 8ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador ALEX HELENO SANTORE
Votante: Desembargador ALEX HELENO SANTOREVotante: Desembargadora FERNANDA SELL DE SOUTO GOULARTVotante: Juiz JOAO MARCOS BUCH
MARCIA CRISTINA ULSENHEIMERSecretária

Fonte: TJSC

Imagem Freepik

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